terça-feira, 23 de outubro de 2012

CÂMPUS UNESP JABOTICABAL - ÁRVORES

POR UMA ÁRVORE (CARTA ABERTA)
escrita em 21 de outubro de 2006 por Maria Esmeralda Payão Demattê - professora aposentada, Unesp-FCAV.
    

     Coloco esta carta aberta aqui no blog, escrita pela prof. Esmeralda, não apenas como divulgar mais um dos seus gritos de protesto (feitos por ela tantas vezes), mas também por informações históricas que esta carta contêm.

     Se um dia me perguntarem de que modo demonstrei minha gratidão por trabalhar durante tantos anos, em um lugar tão belo como o Câmpus de Jaboticabal, direi que procurava ensinar o que aprendia. Plantei árvores, jardins e sonhos. Ajudei a criar ambientes para abrigar a vida.
Muitos, antes e depois de mim, fizeram isso, mais e melhor. Como disse João Cabral de Melo Neto, "Um galo sozinho não tece uma manhã". Há muitas heranças na paisagem do Câmpus.
     O Câmpus da Unesp de Jaboticabal tem um valiosíssimo patrimônio paisagístico, formado ao longo de muitas décadas, com a contribuição amorosaa e competente de muitas pessoas. Os benefícos, especialmene os da contemplação da beleza, do conforto térmico e da sombra acolhedora, são usufruído por todos, mas nem todos se dão conta disso.
     Quando aqui cheguei, em 1974, já havia árvores antigas e outras recém-plantadas, além de um lindo e diversificado arboreto, formado pelo Prof. Ivor Bergemann de Aguiar. Conjuntos de belo efeito, incorporando árvores e palmeiras, já haviam sido criados pelo Prof. Pedro Dantas Fernandes. Lembrarei também de tantas espécies perenes que foram introduzidas depois pela Professora Taís Tostes Graziano e, mais recentemente, dos jardins idealizados pela Professora Kathia Fernandes Lopes Pivetta e pelo grupo Oficina da Paisagem. Reflorestamentos heterogêneos com espécies nativas têm sido feitos pelo Prof. Sérgio Valiengo Valeri.
     Acho até que todos, em nossa comunidade unespiana, têm sua árvore no Câmpus. Alguns trouxeram a muda de longe e plantaram. Outros a plantaram em um evento, muitas vezes a sua formatura. Houve os que cuidaram de árvores que cresciam perto do local de trabalho.E há, ainda, os que são representados por uma árvore. (A que me representa é uma jaboticabeira, plantada em 1991, quando Jaboticabal completou 163 anos).
Dos exemplares arbóreos antigos, os mais notáveis são duas enormes tipuana, em frente ao velho prédio central, plantadas em 1937. Elas são, às vezes, motivo de inquietação de quem administra. Seus galhos retorcidos, cobertos de epífitas e , especialmente, um grande oco, que apareceu na parte baixa do tronco de uma delas, têm provocado o temos de queda. Sempre pedi por sua vida. O oco foi tratado já faz muitos anos, com ótimo resultado. Sábio seria, se há temos de que as tipuanas caiam em cima dos carros, desativar o pequeno estacionamento em baixo deles e dar-lhes liberdade de espaço para encantarem a quem as vê.
Existem ainda outras grandes árvores antigas no Câmpus. Por exemplo, na área do Departamento de Engenharia Rural, há um magnífico cedro, preservado por ação daquele Departamento. Se, ainda hoje, essas velhas árvores nos oferecem sua sombra, é porque alguém, certa vez, defendeu sua permanência.
Havia também o deslumbrante conjunto de paus-ferro que margeavam a quadra do Restaurante Universitário e que foram cortados no começo deste ano, porque um deles caiu sobre a livraria da Funep e a destruiu. Há anos, quando eu coordenava os trabalhos do parque, foi pedida minha opinião sobre o possível risco que a proximidade daquela grande árvore representava para o prédio da livraria, com muitas partes de vidro. Meu parecer foi o de que havia risco, sim, principalmente de queda de galhos, e que o prédio deveria ser dasativado, porque a árvore já estava lá muito antes dele. O parecer não foi levado a sério.
Antes, por volta de 1977, esses paus-ferro tinham sido salvos do corte pelo Prof. Pedro Dantas Fernandes e por alunos de graduação. Uma rede elétrica avançava e, no seu caminho, estavam as velhas árvores. Travou-se então, uma batalha em que se enfrentaram os que queriam construir a rede e os que queriam conservar as árvores. Tudo acabou num concenso sensato, desviou-se a rede elétrica, e os paus-ferros foram preservaods. Eram outros tempos, quando mais gente se lembrava de que somos uma escola e que cabe a nós dar exemplos. Hoje, nao se batalha mais para salvar uma árvore, e as poucar vozes em sua defesa perdem-se no vazio. Cortam-se árvores porque estão onde alguém quer construir ou, até, pelo simples fato de serem grandes, sob a alegação de perigo. Quando chega a moto-serra, aproveita-se para cortar também árvores vizinhas, como aconteceu no caso do consjnto dos paus-ferro: um enorme amarelinho-da-amazônia (terminalia sp), único individuo de sua espécie no Câmpus e em toda a região, perfeitamente sadio, foi também cortado.
Em nossa cultura, os edifícios são mais valorizados do que as árvores. Quado determinado edificio público apresenta sinais de que pode desabar, geralmente se faz uma perícia e, enquanto isso, a área onde ele se encontra é isolada. Conforme o resultado da perícia, o edifício poderá ser reformado ou demolido. Se uma reforma puder resolver o problema, ela é, quase sempre, preferida, para economizar recursos financeiros.
por que não usar o mesmo critério para árvores? Por que não isolar a àrea onde está uma árvore supostamente perigosa e contratar uma perícia? Se for possível fazer um tratamento para recuperar a árvore, por que não fazê-lo, em vez de derrubar? mesmo quando estão em propriedade particular, as árvores beneficiam toda a comunidade, sendo, por isoo, um bem público. Se compararmos o valor de um edifício ao valor de uma árvore, a a´rvore vale tanto ou mais, Um edifício pode ser constru[ido com dinheiro; uma árvore, não. Porque, ao contrário dos edificíos, a árvore é uma criatura viva.
As árvores têm funções de extrema importância que passam despercebidas. Contribuem para a infiltração da água das chuvas, porque parte da água interceptada pela copa escorre pelo tronco e entra no solo, que é mais permeável por causa da presença das raízes. O conforto que elas oferecem não é causado somente pela sombra - também a transpiração que ocorre nas folhas faz diminuir a temperatura do ar circundante, por causa da transformação da água no estado líquido para o estado de vapor. E hoje, muitos cientistas, governos e instituições trabalham para aumentar a quantidade de árvores no Planeta, por causa da necessidade de diminuir o teor de carbono do ar.
O valor das ávores é reconhecido por lei. O Código Florestal Brasileiro menciona, como motivos suficientes para sua preservação, a localização, a raridade, a beleza ou a condição de porta-sementes. Legislações diversas citam também sua impôrtancia histórica, ecológica e cultural.
Estas reflexões são um modo de expressar a minha dor pelo corte da grande sibipiruna nao lado do prédio do *Banespa, no segundo final de semana deste outubro. Era a maior e a mais bela sibipiruna do Câmpus e, talvez, da cidade. Uma espécie nativa.
Quando, há décadas, o prédio do Banespa ia ser construído, reinvidicamos, outras pessoas e eu, que o local da construção fosse mudado, porque queriam cortar a árvore, próxima demais do lugar escolhido no projeto. A mudança foi feita para uma distância considerada segura pelos responsáveis, e a árvore foi preservada.
Agora, foi cortada. Estava em bom estado sanitário e em espaço livre de construções. Talvez o motivo tenha sido o seu enorme porte, a magnififica envergadura de sua copa, a força de sua presença.
No passado, eu gritava, brigava, mesmo diante do fato consumado. Hoje, sei que só me resta chorar.Já aprendi que , para defender árvores, não adianta brigar. A destruição de árvores, a falta de cuidado com a àgua , o solo e o ar, a crueldade contra os animais e os atos de violência contra pessoas são gerados pela mesma raiz. Derrubar árvores, por causa de problemas que poderiam ser resolvidos de outra maneira, é uma aula prática que ensina a sociedade a desprezar a vida. Somente quando as pessoas entenderem isso, somente quando olharem para  uma árvore com amos e gratidão, só então, ela estará protegida.
*hoje banco Santander.

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