sexta-feira, 31 de agosto de 2012

A CULTURA DE ELITE E A CULTURA POPULAR (parte II)

A CULTURA DE ELITE E A CULTURA POPULAR 
texto escrito por *Jose Adriano Fenerick
*prof.dr. na Unesp de Franca,SP


            Pensar a cultura como sinônimo de Belas Artes (e apenas isso), mesmo sendo prática corriqueira, não deixa de apresentar uma série de problemas que precisam ser equacionados antes de qualquer proposta de ação cultural ou de política cultural, sob pena de se cometer equívocos e erros muito graves. Embora seja possível rastrear essa definição de cultura desde o Iluminismo (século XVIII), ela é uma definição Romântica (século XIX). Ela representa aquilo que o grande teórico inglês - responsável pela criação dos Estudos Culturais britânicos nos anos de 1950/60 - Raymond Williams, chamava de “cultura da casa de chá”, ou, da definição “Opera House” de cultura (que poderíamos traduzir como sendo uma definição elitista de cultura). Isto é, definir cultura assim, é dizer que apenas um grupo (ou classe) social é portador de cultura, pois as Belas Artes e o conhecimento científico são as expressões máximas da cultura burguesa. Como lembrava Williams, em sua crítica a  essa definição:
“Não precisamos ser rudes e nem grosseiros com os portadores dessa cultura, precisamos apenas questioná-los”.
Vamos, então, questionar essa noção de cultura e ver o que sai disso.
A primeira coisa que sai é essa:
a cultura (as artes) é uma coisa supérflua...ou perigosa! No caso da política cultural governamental brasileira há, historicamente, uma alternância (ou um misto) entre um certo desdém e uma grande preocupação em domesticá-la. Uma época onde houve muita preocupação do Estado para com a cultura (as artes), foi no período da ditadura militar. Período esse que viu ser criada a EMBRAFILME, o Conselho Federal de Cultura, a FUNARTE entre outras coisas, mas também presenciou a adoção...da censura prévia, instituída a partir do AI-5, em 1968. Ou seja, para os militares, a cultura era, antes de tudo, perigosa. Precisava-se ou cooptá-la (por meio dos programas federais de incentivo a cultura – os dependentes de financiamento estatal raramente podem ser livres em relação a um Estado Autoritário, e assim, muitos foram cooptados pela política governamental dos militares), ou calá-la (por meio da censura). Hoje em dia estamos vivendo um outro momento histórico, diferente da época dos militares, mas não menos preocupante. Basta dizer que, atualmente, o Ministério da Cultura é um dos ministérios que possui a menor verba disponível, assim como as secretarias estaduais e municipais de cultura (isso quando o município possui uma secretaria de cultura, pois nem todas as cidades possuem uma secretaria exclusiva para a cultura). E por que isso ocorre? Falta de sensibilidade política? Falta de vontade política? Falta de programa político para a área de cultura? Falta de gente especializada e competente? Sim, tudo isso junto, e mais uma coisa: incompreensão do que seja cultura.
Quando não é vista como perigosa, a cultura é vista como supérflua. Os políticos brasileiros (salvo as raríssimas exceções de praxe), têm uma compreensão, na melhor das hipóteses, apenas parcial do fenômeno, e isso os leva a deixar a cultura de lado. Os governantes (salvo as raríssimas exceções de praxe, novamente) partem, mesmo que inconscientemente, do conceito Romântico de cultura, isto é, cultura como sinônimo de Belas Artes, e, portanto, como uma atividade que não está diretamente relacionada com a sobrevivência imediata das pessoas - pois o romantismo pregava ser a arte uma produção voltada apenas para o “deleite do espírito” (a arte não pode e nem deve ser vista assim, estou aqui me referindo apenas e tão somente à concepção romântica, idealista, de arte) -, eles vêem a cultura como algo supérfluo e a deixam em segundo ou terceiro plano (ou a usam de forma eleitoreira, isso também ocorre muito). Pois os governantes, no geral, se preocupam com as coisas relativas à sobrevivência imediata das pessoas (saúde, transporte, emprego etc.), e pouca importância dão para aquilo que eles entendem como supérfluo, e a tratam, no máximo, como um lazer despretensioso – uma coisa somente para divertir e entreter as pessoas na suas horas de folga. Mal sabem eles, os nossos governantes, que o ser-humano deixou sua condição animal de besta-fera para começar a se fazer Humano graças à cultura, em seu sentido mais amplo, e nada mais concreto e material na vida humana que a cultura, mas deixemos esse tema para uma próxima oportunidade...
           

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